O Uso do Divã na Clínica Lacaniana
- Linsei Oishi
- 6 de jun. de 2023
- 2 min de leitura

"Klínicos" em grego designava aquele que visitava o doente que estava na cama; é derivado de "kline": cama ou leito. Na história da medicina, o surgimento da "clínica" no sentido moderno implica uma mudança muito forte na posição do médico. Durante longos períodos da história, o médico teve como função principal, além de ser o receptor das demandas causadas pelo sofrimento, ajudar (às vezes apenas a morrer) os doentes de acordo com os ritos de cada cultura.
Enquanto isso, com o surgimento da clínica moderna, a intervenção médica começou a ser deduzida a partir do que o sofrimento estabelecido indicava sobre o que estava acontecendo "na cama", o que hoje é conhecido como o "dado clínico", interpretado de maneira científica.
Na clínica psicanalítica, o paciente não está deitado na cama, mas sim deitado no divã. O uso do divã no dispositivo analítico não é uma questão de "ritos" ou costumes, mas sim de estrutura da clínica psicanalítica. O divã é usado por questões estruturais, embora geralmente obscuras. A clínica psicanalítica não é uma clínica da visão, mas sim da escuta e de uma leitura construída a partir dela.
Além disso, é claro que o divã, a cama, introduz na experiência analítica as conotações sexuais que o deitar e a cama têm para os sujeitos adultos, o divã incorpora na cena psicanalítica o lugar da sexualidade, mas como um lugar vazio.
Finalmente, o uso do divã na prática analítica testemunha que não só se opera com a noção de estrutura como significante, mas também que a experiência se localiza na interseção da estrutura do significante e do corpo; daí sua relação com o leito e a prática médica. Os analistas operam na articulação da estrutura do significante e do corpo, e por isso é necessário o divã: é o lugar onde o corpo e seu sofrimento são abrigados, quando isso vale algo além de sua imagem ou do puro significante.
A aparição do psicanalista indica a necessidade, em certo momento do desenvolvimento do mal-estar na cultura ocidental, de uma determinada mudança na função desempenhada até então pelo médico. Qual função? Ser receptor das demandas de sofrimento ou dor. O médico moderno, ao se considerar "científico" em vez de "praticante" (aquele que exerce uma prática real e simbólica sobre o real), ao sustentar cada vez mais sua prática nos diagnósticos feitos por dispositivos impessoais desenvolvidos pela tecnologia e ao ser cada vez mais distribuidor de medicamentos, deixou de ser aquele que se torna o receptor ou destinatário das queixas do padecimento. Freud já denunciava em 1919 que os médicos, há décadas, não recebiam na sua formação acadêmica o treinamento necessário para o correto exercício de sua prática (a ação terapêutica), pois ela estava quase inteiramente circunscrita à química, física e anatomia, ou seja, a certos ramos da ciência.
Assim, é o psicanalista quem surge como figura social devido a que ele atua como substituto de uma função que o médico deixou de cumprir. O psicanalista é a única oferta moderna, racional e personalizada para receber o sofrimento subjetivo com estrutura de verdade, para além de um distúrbio dos tecidos ou células.
Trecho do livro: Las Estructuras Clinicas a Partir de Lacan, de Alfredo Eidelsztein.
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