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  • Foto do escritorLinsei Oishi

Psicanálise e Ciência - Parte 2

Atualizado: 28 de jul. de 2023


A psicanálise é uma ciência?


A psicanálise não é uma ciência?


Para refletir com seriedade sobre este tipo de problemas, é necessário partir, ao menos, das seguintes premissas:


1. Não existe um elemento específico para estabelecer o que é ciência no sentido moderno do termo;

2. Não há consenso entre os epistemólogos sobre qual seria o conjunto das propriedades mínimas do saber racional para que seja consider


ado científico;

3. Tampouco há consenso entre os estudiosos a respeito da estrutura das relações entre as propriedades consideradas.


O limite que impede que a comunidade de analistas coloque-se estas perguntas reside no preconceito que sustenta que a ciência é uma disciplina empírica, na qual um investigador neutro observa reiteradamente através de algo


como um microscópio ou um telescópio.


A existência da matéria observável investida de energia, a observação neutra e a obtenção de conclusões a partir de repetidas experiências idênticas, é uma concepção da atividade científica – o indutivismo – que é sustentada na atualidade quase exclusivamente por M. Bunge; a concepção oposta – o “hipotetismo dedutivista” – que afirma que se parte sempre de uma ideia, hipótese ou pergunta e que o observável e experimentável somente advém em seguida, é sustentada por todas as distintas correntes epistemológicas do século XX (Koyré, Bachelard, Kuhn, Lakatos, Popper, Feyerabend etc).



Mais ainda: as físicas modernas, como a relativista, a quântica, a de cordas, etc., surgiram fundamentalmente, como também afirma Lacan, de experimentum mentis, não de observações.


Freud foi indutivista e sustentou uma posição idêntica a do empirismo lógico do Círculo de Viena, já Lacan, foi um firme apoiador do mod


elo hipotético dedutivo.


Na história da psicanálise se registrou e se registra ainda a oposição entre estes dois modelos que, para especificá-los melhor, pode ser caracterizado assim:


Freud concebeu e inseriu o saber e prática da psicanálise na lógica de “giro biologicista e naturalista”. Para ele, primeiro é o corpo biológico com sua matéria (a substância viva) e suas energias (as pulsões e a libido) e as vivências inefáveis produzidas pelo encontro com a realidade. Lacan o fez em torno da articulação do “giro linguístico” e o postulado estrutural em relação íntima com as concepções das mais modernas ciências: as matemáticas (topologia, números reais, cálculo infinitesimal, etc.) e as físicas (relativista, quântica, de cordas, de supercordas, etc.). Todas elas concebidas como ciências formais. Assim, tem-se duas concepções opostas do real: para Freud consiste no encontro da substância viva e suas energias com os estímulos do meio, observáveis por um experimentador neutro; para Lacan, o real para o sujeito da ciência com o qual pratica a psicanálise consiste no impossível lógico matemático sustentado segundo a posição que assume o executante. Para Freud, a ciência do real é a biologia; para Lacan, a lógica matemática.


O problema fundamental não é tentar contestar a pergunta: “a psicanálise é uma ciência?”, mas sim colocarmos aos psicanalistas a questão crucial que funcionará como apoio, sustentando o fundamento de nossas reflexões teóricas e sua prática associada.


Para todos aqueles colegas analistas que sustentam com grande firmeza que o psicanalista é o resultado de sua experiência analítica, faço uma pergunta: isso o experimentaram em uma série de vivências pessoais ou o ensinaram como um axioma velado por sua própria apresentação de produto de sucessos acontecidos?


Podemos questionar-nos a respeito das orientações possíveis: a psicanálise será uma experiência transmitida de um praticante a outro através de vivências individuais relativamente inefáveis (como são colocadas todas as vivências desta índole) ou consistirá em um modelo teórico surgido em certas condições epistêmicas que em seu funcionamento cria uma prática e os objetos sobre os quais o faz segundo uma posição que funda quem o busca e o pratica?


Em relação ao futuro da psicanálise: se tratará de investigar, estudar e refletir no âmbito das relações com outros saberes racionais e em especial os que possuem espírito científico, ou de fazer experiências pessoais somente transmissíveis de um a outro?


Tudo isso nos obriga a refletir a res


peito de que modelo funcionará como fundamento orientador das concepções psicanalíticas e suas práticas derivadas: aquele que se apoia nas ciências (tais como a matemática, a física relativista, a quântica, a linguística, etc.) ou aquele que o faz sobre discursos religiosos (fé e crença em um Pai fundador), práticas artísticas (fundamentalmente poéticas), práticas sobre experiências vivíveis e inefáveis (místicas), filosóficas (o que é o ser e, em especial, o ser do homem), etc.?


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